Um bebê de apenas 30 dias faleceu nesta segunda-feira (24) no Hospital do Seridó, em Caicó, após dias de espera por uma vaga em uma UTI neonatal. José Emanuel Medeiros Silva foi internado com uma infecção e, depois, apresentou complicações cardíacas. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, a avó da criança, Maria Aparecida de Medeiros, contou como foi a luta para salvar a vida do neto diante de um diagnóstico desconhecido, recusa de hospitais em Natal e a falta de transporte adequado para transferência hospitalar. De acordo com a Secretária de Saúde Pública do Rio Grande do Norte (Sesap), o motivo da recusa dos hospitais em Natal será investigado.
Por volta das 23h30 do sábado (22), os familiares dele chegaram ao hospital em busca de ajuda. De acordo com a avó, a criança chorava muito e tinha secreções saindo pelo ouvido. No atendimento médico, a pediatra constatou que o bebê apresentava um quadro de infecção e que seria necessário internar. “Ele estava com suspeita de infecção generalizada. Fizeram uma medicação nele, mas não sabemos qual, e ele passou bem a noite. Dormiu tranquilo. Pela manhã, ele acordou bem e recebeu outra medicação, também sem nos informarem qual era”, relatou a avó.
Apesar de estar internado, o organismo de Emanuel apresentava resposta aos medicamentos, mas o estado de ainda era crítico. “Depois disso, levaram ele para fazer um exame. Foi nesse momento que ele teve a primeira parada. Conseguiram reanimá-lo. O resultado do exame apontou apenas que ele estava com uma infecção, mas até agora não sabemos qual o tipo exato. O estado dele piorou, e os médicos decidiram entubá-lo. Disseram que ele precisava de uma UTI. Tentamos, junto com familiares de Natal e com a pediatra que o acompanhava, conseguir uma vaga. Ela lutou muito por isso. Conseguimos duas vagas em Natal, mas os dois hospitais se recusaram a recebê-lo e até agora não sabemos o motivo”, afirmou.
Em seguida, uma vaga foi confirmada em Mossoró, no Oeste potiguar, a 191 km de distância, cerca de 2h30 de viagem. Mas a transferência não ocorreu por falta de transporte adequado e pela instabilidade do quadro clínico do bebê. Uma tentativa de deslocamento chegou a ser feita no domingo, após uma breve melhora na saturação de oxigênio. No entanto, a condição de saúde voltou a se agravar ainda na preparação para o transporte, forçando a equipe médica a cancelar o traslado.
Na tentativa de salvar o neto, Aparecida chegou a fazer um apelo público nas redes sociais no domingo (23), pedindo agilidade na transferência do bebê para uma unidade especializada. Naquele momento, a saturação de José não tinha estabilizado o suficiente para ser transferido de hospital, foi quando ele apresentou alterações cardíacas graves.
“Os médicos ficaram com ele direto, monitorando tudo. Por volta de meia-noite, a saturação subiu para 97 e os batimentos cardíacos foram a 154. O médico então disse que ele estava pronto para a transferência, que ia dar certo. O Samu foi acionado. O médico deixou claro que, se a saturação caísse, voltariam imediatamente. Concordamos. Só que a ambulância nem saiu de Caicó. Na zona Norte da cidade, a saturação já começou a cair de novo. Voltaram às pressas para o hospital. Refizeram todos os procedimentos, mas, pela manhã, ele teve outra parada cardíaca e não resistiu”, narrou a familiar.
Na manhã desta segunda-feira (24), após completar um mês de vida, José Emanuel morreu devido a uma parada cardíaca. “A mãe está em choque. O pai também. Eu tô falando com você e nem sei de onde estou tirando forças. O avô está arrasado. A família inteira está em choque. A gente simplesmente não consegue acreditar. Na sexta, estávamos com ele. No sábado também. Quando ele chorava, colocávamos ele na cama com a gente, e ele dormia ali, no nosso colo. Vai ser muito difícil daqui pra frente aceitar isso. Eu lutei pra salvar ele”, desabafou.
Sem Respostas
“Não sabemos o que foi”. É dessa forma que ela descreve o motivo da morte do neto. Maria Aparecida procura por respostas que possam justificar a morte precoce do José Emanuel. Além da causa, há outros por quês que ainda não foram respondidos como, por exemplo: por que os hospitais em Natal não receberam Emanuel? Por que o helicóptero não estava mais disponível para transferir o bebê para Mossoró?
“Foram dois que se recusaram a recebê-lo: o Hospital Maria Alice [Fernandes] e o Varela [Santiago]. Mas a gente não sabe o motivo dessas recusas. Também não sabemos o que foi informado daqui pra lá. Só sabemos que não aceitaram”, afirmou.
Sobre o helicóptero, que poderia levar Emanuel para o hospital em Mossoró em menor tempo, a avó da criança afirmou que foi informada que o veículo só operava até 15h, sem mais justificativas. “Mossoró foi o único hospital que aceitou. Só que ele não chegou a ir, infelizmente, porque não havia transporte adequado pra levar ele até lá. O helicóptero, que seria uma opção mais segura, já não podia ser acionado porque só funcionava até as 15h”, contou.
“O maior problema foi a transferência. Não tinha um transporte adequado pra levar ele. E justamente na hora em que ele estava bem, estabilizado, era o momento certo pra transferir. Se tivessem conseguido levar ele naquela hora, talvez ele tivesse resistido. Mas Natal [em referência aos hospitais] se recusou a recebê-lo. Foi quando apelamos pra Mossoró. Lá aceitaram, se mostraram prontos pra recebê-lo. Só que, mesmo Mossoró não sendo tão longe de Caicó, tem uma certa demora de carro, e a saturaçãozinha dele já não estava mais estável”, relatou a avó.
Em relação a causa da morte de José Emanuel, Maria Aparecida disse que “até agora a gente não sabe o diagnóstico dele. Só falaram dessa infecção. Chegaram a perguntar se ele teve contato com alguém doente. Mas ele não teve, porque não recebia visitas. Era só a gente de casa, e tomávamos todos os cuidados com ele.”
Outra suspeita apontada por um dos médicos que atendeu Emanuel é que a mãe do bebê teve diabetes gestacional e que isso poderia ter desencadeado essa complicação nele. No entanto, isso não foi confirmado. “Como aqui não tem muitos recursos como em Natal, o médico comentou que poderia ser um probleminha no coraçãozinho, por causa da diabetes gestacional da mãe dele. Disse que, às vezes, pode acontecer. Mas mesmo isso não foi confirmado”, explicou.
Em nota, a Secretária Estadual de Saúde Pública (Sesap) lamentou a morte de José Emanuel e afirmou que a transferência do paciente não ocorreu por “falta de condições clínicas”. O motivo da recusa dos hospitais em Natal será investigado.
Leia a íntegra da nota:
A respeito do falecimento do recém-nascido, ocorrida em Caicó neste domingo (23), a Secretaria de Estado da Saúde Pública esclarece que havia leito neonatal disponível na rede SUS e a transferência do paciente não pôde ser feita por falta de condições clínicas, o que impediu o SAMU de conduzir a criança até Mossoró.
O pedido de leito foi registrado no sistema de regulação pelo Hospital do Seridó, de gestão municipal, no início da manhã e a vaga foi confirmada em Mossoró no início da tarde. Neste período, o Hospital Estadual Telecila Freitas Fontes, da rede Sesap, também cooperou com a assistência ao paciente, enviando equipamentos para a unidade onde ele estava internado. O processo de regulação, que antes do aceite em Mossoró passou por outros quatro hospitais, será apurado em um processo administrativo interno acompanhado pela gestão da Sesap.
A Sesap destaca ainda que, nos anos recentes, investiu na abertura de novos leitos neonatais, tanto de UTI como de cuidados intermediários, ampliando a cobertura em todo o estado. Assim, a regulação de leitos não registra fila para a assistência neonatal.
A Secretaria de Saúde lamenta profundamente a perda, solidariza-se com todos os familiares da criança e se coloca à disposição para a assistência necessária.
Fonte: Tribuna do Norte
Foto: Prefeitura de Caicó
